sexta-feira, 27 de janeiro de 2012



O “PRÍNCIPE DOS POETAS” DEFINITIVAMENTE EM CASA:
MUSEU CASA GUILHERME DE ALMEIDA

POR: SILVANIA SILVEIRA




o museu biográfico e literário Casa Guilherme de Almeida 
é uma instituição da Secretaria de Estado da Cultura, Administrado atualmente em parceria com a Poiesis – Organização Social de Cultura.



Inaugurado em março de 1979, abriga um significativo acervo composto de objetos que pertenceram ao poeta, tradutor, jornalista e advogado paulista Guilherme de Almeida (1890-1969), um dos mentores do movimento modernista brasileiro. O museu está instalado na residência onde ele viveu de 1946 até o ano de sua morte. 
A Casa Guilherme de Almeida — cujo objetivo central é promover o conhecimento da obra do poeta — oferece ao público intensa programação cultural, relacionada ao amplo campo de atuação de Guilherme, incluindo-se cursos, oficinas, palestras, mesas- redondas e recitais.
Uma das áreas de produção de Guilherme de Almeida, com a qual conquistou especial notoriedade pela excelência dos resultados, é a da tradução de poesia: o fato motivou a criação, no museu, de um Centro de Estudos de Tradução Literária, cujo objetivo é oferecer atividades relacionadas à teoria e à prática da tradução, bem como à obra do poeta. Outra finalidade do Centro de Estudos é a realização de edições, também voltadas aos segmentos em que Guilherme atuou: diversos livros já foram publicados por iniciativa da Casa — incluindo-se reedições de trabalhos do escritor —, em colaboração com diferentes editoras.
Após um período fechado, para reestruturação e obras de adequação, o museu reabriu, em dezembro de 2010, à visitação pública. As visitas, sempre orientadas, são realizadas de terça a domingo, das 10h às 18h.


POETA E TRADUTOR, O POETA PAULISTA, GUILHERME DE ALMEIDA, DEIXOU UMA OBRA COM MAIS DE 75 PUBLICAÇÕES.

Guilherme de Andrade e Almeida nasceu em Campinas, SP, a 24 de julho de 1890. Filho do jurista e professor de direito Estevão de Araújo Almeida e de Angelina de Andrade Almeida passou os primeiros anos da infância nas cidades de Limeira, Araras e depois Rio Claro, onde realizou os estudos primários. Em 1902 tornou-se aluno do Ginásio de Campinas e, em 1903, com a vinda da família à cidade de São Paulo, ingressou no Colégio de São Bento; formou-se, em 1907, no Ginásio Nossa Senhora do Carmo, dos Irmãos Maristas. Em 1912, concluiu o curso da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco; após a formatura, atuou como promotor público em Apiaí e em Mogi-Mirim. De volta à Capital em 1914, trabalhou com o pai até 1923, quando passou a se dedicar prioritariamente à atividade de escritor, iniciada alguns anos antes.


Livro Mon Coeur Balance/ Leur Âme/ Histoire de la Fille du Roi, Oswald de Andrade - Editora Globo
Nova Versão da Editora Globo


Guilherme de Almeida e Osvald de Andrade




A estreia literária de Guilherme de Almeida se deu em 1916, com Mon Coeur Balance e Leur Ame (teatro), peças escritas em colaboração com Oswald de Andrade, editadas sob o título deThéatre Brésilien



Seu primeiro livro de poemas, Nós, veio a lume em 1917; ao qual se seguemA dança das horas e Messidor, ambos de 1919, e o Livro de Horas de Sóror Dolorosa, publicado em 1920. Escreveu, em 1921, o ensaio Natalika e os atos em verso Scheherazada e Narciso – A flor que foi um homem. Publicou Era uma Vez... em 1922. Nesse mesmo ano, atuou decisivamente na realização da Semana de Arte Moderna, ao lado de Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Di Cavalcanti e Menotti del Picchia, entre outros. Ajudou a fundar a revista Klaxon (porta-voz do movimento), integrando a equipe de editores; criou a capa do periódico, além de anúncios publicitários dos patrocinadores, de concepção precursora da visualidade da arte de vanguarda e da própria propaganda moderna.

O poeta casou-se em 1923 com Belkiss Barroso do Amaral (Baby), e mudou-se para o Rio de Janeiro, onde permaneceu até 1925. Nesse ano publicou quatro livros de poemas: Narciso, Encantamento, Raça e Meu, consistindo, estes dois últimos (principalmente Meu), no ápice de sua poesia modernista. Escreveu, também nesse ano, a conferência "Revelação do Brasil pela poesia moderna" e a apresentou no Rio Grande do Sul, em Pernambuco e no Ceará, a fim de difundir os ideais estéticos do Modernismo; regressou, em seguida, a São Paulo.


Em 1932, Guilherme participou ativamente da Revolução Constitucionalista, chegando a se alistar voluntariamente, como soldado raso, e a lutar na cidade de Cunha. Ao final desse Movimento, foi preso e exilado em Portugal, onde permaneceu até o ano seguinte. A estada naquele país forneceu elementos para a elaboração do livro de prosa O meu Portugal, publicado em 1933.

Eleito em 1928 para a Academia Paulista de Letras e, em 1930, para a Academia Brasileira de Letras, Guilherme de Almeida foi, durante décadas, o mais popular poeta paulista. Sua obra compreende cerca de 75 publicações, entre poesia, prosa, ensaio, tradução, além do extenso trabalho jornalístico, ainda esparso; deste, destaque-se sua coluna "Cinematógrafos", pioneira da crítica cinematográfica em nosso país, mantida no jornal O Estado de S. Paulo entre as décadas de 1920 e 1940. Em 1959 foi eleito "Príncipe dos Poetas Brasileiros" em concurso patrocinado pelo jornal Correio da Manhã, por meio da seção "Escritores e livros"; escolhido por um "colégio eleitoral" de cerca de mil componentes, concorreu com os poetas Manuel Bandeira, Carlos Drummond da Andrade, Vinicius de Moraes e Mauro Mota.


O lindo poema reproduzido a seguir pertence ao livro “O Anjo de Sal”, de 1951:


                                                            LEMBRANÇA

autumnLembro o pudor da paisagem
e a fanfarra de perfumes
que o claro clarim dos lírios
abria nas madrugadas.
Lembro o susto dos insetos
na castidade das águas,
e as asas do pó fugindo
atrás da luz desnudada.
Lembro a fala dos caminhos
ao longo dos passos cegos,
e os ventos enovelados
na cabeleira das nuvens.
Lembro o bulício da palha
quando pisavas a tarde,
os olhos cheios de folhas
e as mãos repletas de ninhos.
Lembro a noite dos meus olhos
sem luas no seu silêncio,
quando ficavas na sombra
e a sombra ficava estrela.
Lembro a palavra parada
na flor adiada da boca,
e lembro o beijo retido
ao gesto alado de adeuses.

[http://literaturaemcontagotas.wordpress.com/2009/09/30/lembranca-de-gulherme-de-almeida/]





Dotado de reconhecido domínio técnico, Guilherme transitou com igual competência por modelos composicionais diversos. Segundo o escritor Lêdo Ivo, em sua introdução à segunda edição de Raça, "talvez mais do que nenhum outro dos participantes da Semana de Arte Moderna, Guilherme de Almeida viveu o drama da conciliação estética do novo com o velho, da fôrma com a forma, da tradição com a invenção, da rotina e do automatismo das receitas com o clamor de criatividade". 


“...dentro da própria morte, o encanto de viver”!

ESTA VIDA

Um sábio me dizia: esta existência,
não vale a angústia de viver. A ciência,
se fôssemos eternos, num transporte
de desespero inventaria a morte.
Uma célula orgânica aparece
no infinito do tempo. E vibra e cresce
e se desdobra e estala num segundo.
Homem, eis o que somos neste mundo.

Assim falou-me o sábio e eu comecei a ver
dentro da própria morte, o encanto de morrer.

Um monge me dizia: ó mocidade,
és relâmpago ao pé da eternidade!
Pensa: o tempo anda sempre e não repousa;
esta vida não vale grande coisa.
Uma mulher que chora, um berço a um canto;
o riso, às vezes, quase sempre, um pranto.
Depois o mundo, a luta que intimida,
quadro círios acesos: eis a vida.

Isto me disse o monge e eu continuei a ver
dentro da própria morte, o encanto de morrer.

Um pobre me dizia: para o pobre
a vida, é o pão e o andrajo vil que o cobre.
Deus, eu não creio nesta fantasia.
Deus me deu fome e sede a cada dia
mas nunca me deu pão, nem me deu água.
Deu-me a vergonha, a infâmia, a mágoa
de andar de porta em porta, esfarrapado.
Deu-me esta vida: um pão envenenado.

Assim falou-me o pobre e eu continuei a ver,
dentro da própria morte, o encanto de morrer.

Uma mulher me disse: vem comigo!
Fecha os olhos e sonha, meu amigo.
Sonha um lar, uma doce companheira
que queiras muito e que também te queira.
No telhado, um penacho de fumaça.
Cortinas muito brancas na vidraça
Um canário que canta na gaiola.
Que linda a vida lá por dentro rola!

Pela primeira vez eu comecei a ver,
dentro da própria vida, o encanto de viver.


Guilherme faleceu em 11 de julho de 1969, em sua casa da Rua Macapá, no Pacaembu, em São Paulo – a "Casa da Colina" –, onde residia desde 1946; adquirida pelo Governo do Estado na década de 1970, a residência do poeta tornou-se o museu biográfico e literário Casa Guilherme de Almeida, inaugurado em 1979, que abriga também, hoje, um Centro de Estudos de Tradução Literária.


O CENTRO DE REFERÊNCIA PARA 
OS ESTUDOS DE TRADUÇÃO LITERÁRIA

Dada a importância do poeta Guilherme de Almeida como tradutor, criou-se na Casa Guilherme de Almeida o Centro de Estudos de Tradução Literária, que funciona paralelamente às atividades museológicas.

O Centro permite a um público mais amplo familiarizar-se com a especificidade da tradução literária e poética, área de conhecimento apenas abordada no âmbito universitário, notadamente de pós-graduação. Para tanto, conta com colaboradores de renome, com sólido trabalho no campo da tradução e dotados de aparato teórico diversificado, bem como de reconhecida prática pedagógica. Além de ocupar um espaço representativo na programação cultural da Casa, a tradução literária é o foco do evento TRANSFUSÃO – Encontro de Tradutores da Casa Guilherme de Almeida, a ser realizado, pela primeira vez, no período de 30 de setembro a 3 de outubro de 2011. Esse Encontro, de frequência anual, foi concebido para promover o intercâmbio entre autores e tradutores brasileiros e estrangeiros e propagar o resultado da reflexão e da produção atuais nesse campo de atividade.

A Casa também promove cursos e palestras voltados à poesia e à literatura, de modo geral, dedicando-se particularmente à obra de Guilherme de Almeida. Realiza, ainda, eventos em outras áreas de atuação do poeta, como o cinema: o pioneirismo de Guilherme na crítica cinematográfica em nosso país inspirou as formação do “Núcleo Cinematographos de Estudos de Cinema” do museu. 



A produção poética do escritor paulista é objeto de investigação do Grupo de Análise e Pesquisa da Obra de Guilherme de Almeida, constituído em 2011 e integrado por especialistas e interessados em literatura. Em julho, mês em que se celebram o nascimento e a morte do poeta, realiza-se anualmente a Semana Guilherme de Almeida, que concentra eventos em torno de sua obra literária, além de abordar outras áreas de interesse e atuação do escritor.

Coleção Estudos & Fontes 

O teatro ídiche em São Paulo, livro de Berta Waldman, coedição da Casa Guilherme de Almeida com a editora Annablume, abriu a Coleção Estudos & Fontes, dedicada (também com base na atuação plural de Guilherme) a trabalhos nas áreas de cultura, história, literatura, poesia, tradução, arte, cinema e música.

Poética de Os sertões, volume contendo o artigo “A poesia d’Os sertões” (1946), de Guilherme de Almeida, e “Transertões”, de Augusto de Campos – que tratam de aspectos poéticos da linguagem euclidiana –, e Margem, último livro de poemas, inédito, de Guilherme de Almeida, são os títulos seguintes da Coleção.

Edições em colaboração

A voz dos botequins e outros poemas, pela Editora Hedra, com a colaboração da Casa Guilherme de Almeida – título dados à atual edição dos poemas de Verlaine selecionados e traduzidos por Guilherme para integrar o volume Paralelamente a Paul Verlaine, por ele lançado em 1944 –, inaugurou o ciclo de lançamentos em 2010.

Flores das “Flores do mal”, livro lançado em 2010 pela Editora 34, com a colaboração do museu, reúne 21 poemas do clássico de Charles Baudelaire recriados por Guilherme, originalmente publicados em 1944. 

Poetas de França, uma colaboração com a Editora Babel, é a quinta edição – lançada em julho de 2011 –, da antologia de poesia francesa (que inclui de François Villon a Paul Éluard), organizada e traduzida pelo poeta paulista, publicada originalmente em 1936.

Coleção Oficinas




O projeto do Centro de Estudos de Tradução Literária iniciou sua Coleção Oficinas com a publicação de uma plaquete contendo a produção de alunos que integraram uma Oficina de Tradução de Poemas realizada em 2010.
A segunda plaquete da Coleção é composta por trabalhos dos alunos de uma Oficina de Tradução de Contos, também realizada em 2010.
Está programada, para 2012, a edição do romance Ruth Hall (1854), de Fanny Fern, traduzido pela primeira vez a nossa língua por alunos da Oficina de Tradução de Prosa, em desenvolvimento.

  
AÇÃO EDUCATIVA DA CASA GUILHERME DE ALMEIDA


O Núcleo Educativo da Casa Guilherme de Almeida está preparado para mediar visitas participativas ao museu, que podem ser agendadas ou espontâneas.
Como complemento às visitas agendadas – feitas em grupos de, no máximo, 20 pessoas –, minioficinas para prática artística e literária, baseadas no acervo da Casa e na obra do poeta, serão ministradas por nossos educadores.
Visitas espontâneas – feitas em grupos de, no máximo, oito pessoas – serão sempre acompanhadas por um educador.

 Referências:
www.google.com.br ( todas as imagens aqui inseridas têm seus autores identificados no google imagens ou no site da Casa Guilherme de Almeida)